Ensaio sobre o pecado

Pecado é haver tantas crianças sem pai nem mãe,
vagando pelas ruas, nuas de afeto
cheirando cola, vivendo de vento
limpando o parabrisa, vivendo de brisa
cheirando cola, dormindo no asfalto
morrendo no asfalto
morrendo de cola, morrendo de fome
com fome de cola, com fome de mãe
com fome de pai
vendendo drops, cheirando cola
dormindo na rua, sem pai nem mãe
sem nome, sem teto, sem chão
dormindo no chão, pedindo um pedaço de pão
pra matar a fome, pra comprar a cola
fugindo da escola
dormindo na calçada, morando na rua
vendo a vida passar
no parabrisa
a vida acabar no asfalto
morrer na calçada
cheirando cola
passando fome
cheirando gente
sem nome, sem pão
sem pai

(Escrito por Zailda Coirano)

Hoje eu vou te amar

Hoje eu vou te amar
e visto-me assim, lentamente
na dolorosa espera
dos beijos teus
meu corpo latejante anseia
por ser tomado, invadido,
subjugado ao peso do teu
levado em suspiros arquejantes
em ondas de desejo e prazer.

Deslizo a meia de seda
que será arrancada, rasgada
num rompante de fúria e paixão
ou tirada aos poucos, entre beijos
que descrevem, ávidos, um caminho
em minha pele latente, carente
com carícias loucas e por fim
ela ficará num canto, abandonada
esquecida entre gemidos de prazer.

Cubro meus seios com rendas finas
onde os mamilos se acomodam, inquietos
esperando sôfregos por teus lábios
desejando ser aprisionados entre dentes
dançar na tua boca
arquejar e entumescer de tesão
e meus olhos cerrados, lacrados,
o gemido de prazer preso na garganta
e assim as rendas se vão.

Entrego meu corpo à carícia
da calcinha vermelha
cor da minha paixão, da minha entrega
onde aos poucos teus lábios
e tua língua sedenta
exploram cada pedaço de desejo
em beijos encharcados de posse insatisfeita
de amor que chega de longe
com cheiro de volúpia e de mar
E abre com carícias plenas
descreve círculos ardentes
fustigando o centro do meu desejo
e me faz explodir, demente
em luzes incandescentes
um mar de prazer e espasmos de paixão.

(escrito por Zailda Coirano)

Gota

gota
perfeita
lacre
da alma
rompe
jorra
serpenteia
reluz
escorre
brota
da alma
ferida
sofrida
alquebrada
que sofre
contorce
dói
chora
gota
de lágrima

(escrito por Zailda Coirano)

Como eu te amo

Te amo
com a pureza das crianças
a grandeza da luz do sol
a certeza do amanhã
a força da tempestade
a urgência dos desgarrados
o desespero das almas malditas
a agonia do pio da coruja
a pressa dos amantes

Te quero
com a pureza dos errantes
a grandeza do amanhã
a certeza da tempestade
a urgência da saudade
a agonia das crianças
a pressa dos desvalidos
a força dos amantes
o desespero do pio da coruja

Te espero
com a urgência da tempestade
a certeza da verdade
a inocência dos aflitos
a força das almas malditas
a pureza do pio da coruja
o desespero das manhãs
a grandeza das crianças
a pressa dos desgarrados.

(escrito por Zailda Coirano)

Soledad

Vuelvo a casa y tú no estás
vacío está el jardín
donde mueren las flores
vacía está mi vida
y mueren mis sueños
sin el agua de tu amor

si no vuelves
vacío quedará mi corazón
donde mi sangre muere a cada hora
que no estás
mis ojos están vacíos
porque no estás aquí

si no retornas
vacía estará mi alma
vacío mi pecho
vacía mi vida
soledad

(escrito por Zailda Coirano)

Sombrio

sombrio

Triste, o ronco triste
do meu peito negro
minha alma moribunda
céu sem estrelas
de dentro um suspiro
último suspiro
caem as trevas
não se vê mais nada
desce o pano
encerra-se o tempo
param os ponteiros
o sol se esconde
aqui dentro no meu peito
não se ouve um ruído
é deserto
é vazio
sombrio

(escrito por Zailda Coirano)

É tarde

É tarde, teu grito
já não chega aos meus ouvidos
que ensurdeceram de dor
É tarde, a lágrima
já não cai do olhar vazio
a última já se foi
É tarde, o coração
endureceu e morreu
já não se comove com o lamento
já não abriga a ternura
É tarde, o amor
voou de meu peito
como um pássaro ferido
que busca um refúgio
pra morrer em paz
É tarde, a noite
caiu e a aurora estertora, moribunda
e não virá mais
É tarde, a alma fria
já não comporta tanta dor
é agora um campo seco
onde mais nada floresce
onde só existe o amargo
o negro e o triste
Eu fui embora
não adianta me chamar
é tarde

(escrito por Zailda Coirano)

Dor

As garras cravam o coração
que se debate, em vão
que chia, que agoniza
e lentamente se contrai
em estertor de morte
e convulsivamente tenta guardar
em seu interior sangrento
restos do amor estraçalhado
pedaços de sonhos moribundos
mas o sangue escorre
e ele se abre
como uma gaiola
deixando voar para sempre
tudo que foi um dia
escorrendo pelos vãos dos dedos
pelo torpor das mãos
que se abrem para libertar
o último sopro
e então só fica a dor

(escrito por Zailda Coirano)

Lua Morena

Lua morena da boca serena
derrama tua luz na minha tristeza
espalha prata por minha mágoa
carrega com seu véu noturno
as lágrimas dos meus olhos
enxuga meu peito de lágrimas
loucas, frouxas, bailarinas
flores cristalinas
cristalizadas de saudade
insanas de vontade
nuvens de prata e dor
águas que caem dos olhos
e se secam em tua luz

(Zailda Coirano)

A vida continua

A vida continua
que importa o vazio
que importa o nada
que importa o desamor
que importa a dor
que importa o fim dos sonhos
o fim do amor
o fim da alegria
o fim da quimera
adeus à felicidade
adeus à vida
adeus à música
o importante é seguir
sem saber pra onde
seguir em frente
seguir, seguir enfim
até tombar de repente
parar para sempre
abandonar o corpo
voar pra eternidade
e a vida continua

(escrito por Zailda Mendes)

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